domingo, 20 de dezembro de 2009

O brilho e o baço....


A consciência da inconsciência da vida é o mais antigo imposto à inteligência. Há inteligências inconscientes - brilhos do espírito, correntes do entendimento, mistérios e filosofias - que têm o mesmo automatismo que os reflexos corpóreos, que a gestão que o fígado e os rins fazem de suas secreções

Fernando Pessoa

Brilham as luzes por todo o lado da cidade. Tremeluzem, como se o mundo fosse a representação de um céu estrelado, mas com pinturas coloridas, substituindo o ténue amarelado real das noites límpidas, quando observamos a via láctea.

As montras comerciais exibem convites natalícios à compra de bens, úteis, mas quase sempre inúteis, porque o prazer de dar viciou as mentes dos homens e das mulheres, que transmitem o ritual aos seus rebentos, que já sofrem desde crianças desta adição. E sem possibilidade de se vislumbrar grande desintoxicação, a menos que seja pela abstinência forçada, nada fácil de suportar, deixando sempre marcas, porque gera revoltas interiores, proporcionando distorções da personalidade.

O Natal é uma operação de marketing. Vende. Cria dependência. Dá lucro. Desenvolve o consumo. Sem presentes materiais não há Natal.

O espírito natalício, esse será um complemento, um meio que justificará o fim a que se destinam os artefactos luminosos, inebriando os seres que alimentam as suas ganas compulsivas de oferecer, porque é Natal.

Natal vem da ideia vocabular de nascimento, é para o mundo ocidental uma memória simbólica do surgimento de Cristo, como revolucionário ideológico, porque influenciou milhões de mentalidades, em torno de uma religião que se instituiu, ainda que desse profeta tenha somente retido as parábolas, mas não o desapego aos bens de riqueza ou de ostentação.

Hoje recorda-se o Cristo pobre, simples, de missão altruísta e tolerante, mas pratica-se a construção de riqueza, o espavento, o egoísmo e a incompreensão. No meio destes antagonismos encontramos certamente o Natal.

Veste-se o fato de Jesus, ao som de melodias angélicas, cria-se o ambiente divinal, juntam-se os cenários mágicos e eis que trocam presentes, extasiam-se meninos, alimentam-se prazeres, respeitam-se protocolos, angariam-se clientes, deliciam-se estômagos com iguarias, praticam-se umas acções solidárias, e…. Cumpre-se a tradição!

O nosso tempo é um tempo de aquisição material. Perdeu-se a fé, porque ela já não satisfaz os espíritos de hoje, no mundo das evidências. Mas ainda há uma réstia de magia ancestral, que se sobrepõe, mesmo aos mais cépticos, herdada dos nossos antepassados das cavernas, que também iluminavam os seus desejos, através da cor brilhante iluminado pelo fogo, expressos nos desenhos rupestres, afinal presentes desejados, por uma caça bem sucedida, com o mesmo sentido da ânsia de sorte que nos leva a receber também em festa profética, o Ano-Novo, incluído nas festas natalícias.